Maila Flesch
Vamos refletir sobre as competências, emocional e relacional. A habilidade de lidar com as próprias emoções e com as emoções dos outros. E a habilidade de lidar com as diferenças pessoais nas relações para criar condições de respeito, pertencimento e cooperação. Para Eric Berne essas capacidades são modeladas na família e na escola. Que tipo de ambiente favorece o desenvolvimento delas? Como promover esse desenvolvimento?
Quando pensamos em competência emocional pensamos na habilidade de identificar e saber como lidar com as próprias emoções e identificar e saber como lidar com as emoções dos outros, partindo do pressuposto que emoções são um aspecto importante da vida e que trazem a possibilidade do afeto, pertencimento e cooperação nas relações humanas. A criança desenvolve a habilidade de identificar e saber lidar com as próprias emoções quando ela tem a oportunidade, desde pequena, de expressar todas as emoções naturais no seu ambiente familiar, ou seja, sentir e expressar alegria, amor, medo, raiva e tristeza.
Na Análise Transacional chamamos de emoções naturais, as emoções do estado de ego Criança Natural e que são um aspecto estrutural do ser humano. São emoções adequadas ao estímulo em qualidade, intensidade e duração. A emoção está no presente. Ocorre que nas famílias nem todas as emoções naturais são permitidas, algumas geram indiferença ou repreensão por parte dos pais. Geralmente isto ocorre porque estas emoções causam desconforto aos pais (eles não sabem como lidar com essa emoção ou a temem inconscientemente) e/ou porque eles têm algum tipo de crença contra essas emoções, por exemplo, "homem não chora" (e portanto não pode ficar triste) ou "você é homem, enfrente a vida com coragem" (não pode ter medo).
Eric Berne postula que os seres humanos nascem OK, ou seja, com a capacidade para a consciência, espontaneidade e intimidade nas relações e que é na convivência e adaptação familiar que essas capacidades são mantidas ou perdidas. Em Os Jogos da Vida, Eric Berne diz: "Os pais, deliberadamente ou inconscientemente, ensinam seus filhos, desde o nascimento, como se comportar, pensar, sentir e perceber". A criança é inicialmente dependente dos pais, dos seus cuidados e do seu afeto. Por isso se adapta aos pais e ao ambiente para conseguir a atenção e o reconhecimento deles. Abre mão de necessidades, emoções e percepções se essas não forem aceitas pelos pais. Geralmente passa a valorizar mais o que os pais afirmam do que o que ela mesma percebe, se isso gerar indiferença ou punição. Com isso passa a guiar-se por um referencial externo em vez de um referencial interno. Dessa forma substitui algumas emoções naturais que não foram aceitas, por outras que são aceitas, pois precisam do reconhecimento dos pais. Quando isso acontece sistematicamente, por exemplo, não pode mostrar tristeza mas pode ficar mal humorado, com o tempo a criança deixa de sentir a tristeza. E passa também a ser indiferente ou preconceituosa com a expressão da tristeza de outras pessoas.
Esse é o caminho contrário do que desejamos, que é a competência emocional. Então, para a competência emocional é importante que nós estejamos abertos e aceitemos todas as emoções dando a mesma importância, ouvindo a criança, deixando ela contar o que aconteceu, o que ela sente, acolher essa emoção, aprender algo com esse momento. Toda emoção tem o seu propósito e é fonte de informação para o que ocorre dentro e fora do indivíduo. O medo fala do perigo, a tristeza fala da perda, a raiva fala de um abuso ou de uma invasão, a alegria fala das conquistas e o amor fala da aceitação e sintonia. Uma vez que ela conhece e expressa as suas emoções ela também será capaz de reconhecer e aceitar as emoções dos outros. E vai lidar com essas emoções da mesma forma que faz com as suas.
Agora vamos falar sobre a competência relacional e seu desenvolvimento na infância. Vou considerar a competência relacional como a habilidade de ter consciência de seus pensamentos, sentimentos e comportamentos e escolher a forma mais adequada de atuar em determinada situação com determinada pessoa. Partimos do pressuposto que as pessoas são diferentes, têm crenças, conhecimentos, comportamentos e emoções diferentes e tudo isso não representa um problema, mas pelo contrário, uma oportunidade de enriquecer e ampliar a questão que se discute ou sobre a qual se deseja trabalhar. Nessa competência se elimina o julgamento e se valoriza a capacidade de ouvir, compreender, refletir e integrar.
A família e as relações da infância são o berço da competência emocional e da competência relacional. Aí se forma o padrão, aprende-se o que funciona, o que pode, o que recebe atenção. A criança constrói a imagem de si mesmo nesse ambiente. Um ambiente estimulante, que dá espaço para experimentar, errar e aprender, facilita que o indivíduo cresça interessado, curioso e ativo. É um ambiente que solicita e acolhe o que a criança é capaz de fazer, falar, pensar, sentir, de acordo com a sua idade. E não pede mais do que a criança pode naquele momento e não pede menos do que ela já pode, pois os dois comportamentos são frustrantes e desestimuladores. Este ambiente que respeita a criança e que ensina a criança a respeitar, estimula a liberdade de agir e escolher com responsabilidade. Na situação ideal, os pais prestam atenção ao filho, às suas necessidades e emoções, ao seu aprendizado, à sua etapa de desenvolvimento, dando reconhecimento para suas conquistas, solicitando apenas o que o filho é capaz de realizar e colocando um pequeno desafio para estimulá-lo a aprender mais. É importante dar várias oportunidades para que o filho mostre o que ele já sabe, para desenvolver a sensação de ser competente.
A criança precisa de reconhecimento e permissão para descobrir, criar, explorar, pensar, fazer, ser diferente, ser ela mesma e expressar suas emoções. Ela também precisa aprender o que causa ao outro quando o invade, machuca, estraga suas coisas, para se tornar empática e interativa.
Pelo que vimos acima, o melhor ambiente para desenvolver a competência relacional é num ambiente OK/OK, que convida ao respeito mútuo, qualifica e reconhece as idiossincrasias, reconhece e aceita as qualidades e limitações, mantém uma visão realista, dá reconhecimentos e elogios autênticos, permite que as pessoas aprendam com os erros e resolvam problemas. Essa posição é desenvolvida ou mantida quando a criança é respeitada e reconhecida de acordo com o estágio de desenvolvimento, o mais importante aqui é o respeito pelo indivíduo, com as suas diferenças e idiossincrasias. Ambientes tóxicos são aqueles onde a criança se sente menos do que os outros, ou se sente mais que os outros.
Retomando e completando a fala de Berne vemos que em Os Jogos da Vida , ele diz: "Os pais, deliberadamente ou inconscientemente, ensinam seus filhos, desde o nascimento, como se comportar, pensar, sentir e perceber... influência necessária para a sobrevivência biológica e social... Libertar-se destas influências não é algo fácil.... De fato, esta libertação só é possível quando o indivíduo se lança a um estado autônomo, ou seja, capaz de consciência, espontaneidade e intimidade..."
Portanto, o objetivo da Análise Transacional é ajudar as pessoas na obtenção da autonomia, que é manifestada pela liberação ou pela recuperação de três capacidades: consciência, espontaneidade e intimidade.
Consciência é a capacidade de estar presente na situação, como se fosse pela primeira vez, no aqui-e-agora, sem rótulos; ao contrário de lidar com a situação como lhe foi ensinado, ou pensando no futuro ou no passado. A questão é: "Onde está a mente quando o corpo está aqui?" A pessoa consciente percebe o ambiente através de todos os seus sentidos, sente o seu corpo (tenso, relaxado, etc), conhece seus sentimentos e fantasias, ouve as pessoas buscando um contato verdadeiro. A pessoa consciente sabe realmente onde está, o que está fazendo e como, e sabe o que pensa a respeito disso.
Espontaneidade é a liberdade de escolher entre todos os sentimentos e pensamentos possíveis (dos estados de ego Pai, Adulto ou Criança). Significa ter se libertado da compulsão de ter apenas os sentimentos que aprendeu a ter, e também ter libertado sua emoção reprimida. A pessoa espontânea assume e aceita a responsabilidade das suas próprias escolhas. Livra-se da compulsão de viver um tipo predeterminado de vida. Muriel James em Nascido Para Vencer, escreve: "Decidir conscientemente em relação a si mesmo com o estado de ego Adulto é ser livre - livre apesar dos instintos e pressões básicos, livre apesar dos caracteres hereditários e influências do ambiente."
Intimidade é a possibilidade de expressar abertamente pensamentos e sentimentos, sem jogos, mentiras ou censura. Para que essa intimidade ocorra é necessário que o ego Adulto, através de contrato, estabeleça um ambiente relacional seguro e protetor. A pessoa com intimidade tende a ser aberta e autêntica vivendo com os outros no aqui-e-agora. Procura vê-los como seres únicos e não através de distorções de experiências passadas.
E como transportar isso que estamos discutindo aqui para o nosso cotidiano e nossas relações pessoais e profissionais? A cada momento vivemos em relação, se mantivermos uma posição existencial OK/OK, convidamos o outro a se sentir OK também. E assim, aumentamos a possibilidade para a consciência, espontaneidade e intimidade.
Nossa proposta: Queremos convidá-lo a refletir como você pode construir e manter ambientes saudáveis para as pessoas adultas e para as crianças com quem convive.
Maila Flesch
Bibliografia:
Berne, Eric - Os Jogos da Vida - Editora Artenova, 1977
James, Muriel - Nascido Para Vencer - Editora Brasiliense, 1975
Joines, Vann & Stewart, Ian - TA Today - Lifespace Publishing Steiner,
Claude - Educação Emocional - Editora Objetiva, 2001
Sabe aquela conversa ou reunião que estava fluindo muito bem até que algo muda no meio do caminho e surge um ruído, uma indireta, uma tensão ou uma discussão? E os participantes saem com um mal-estar ou até mesmo uma dor de cabeça ou de estômago, pensando que “eu não devia ter dito nada”, “não devia ter ajudado” ou outra coisa desse tipo.
A Análise Transacional chama essas conversas de Jogos Psicológicos. Eles são inconscientes, nem percebemos que estão em andamento, mas no final todos se sentem mal e muitas vezes são bastante repetitivos.
Como em outros jogos, também buscamos parceiros para os Jogos Psicológicos, e eles vão ocupar os papéis de Perseguidor, Salvador e Vítima.
Os jogos obedecem uma fórmula: ISCA + FRAQUEZA = RESPOSTA > MUDANÇA > CONFUSÃO e DESFECHO.
Eles estão presentes no dia a dia e nem percebemos, mas são responsáveis por quase todos os conflitos e problemas de comunicação que temos.
Vamos lembrar que quando estamos serenos, tranquilos, felizes não entramos em jogos psicológicos. Geralmente eles acontecem quando entramos no circuito negativo das nossas emoções e pensamentos. Ai sem nos dar conta entramos num desses papéis.
PAPÉIS
SALVADOR
Muitas vezes uma pessoa vê uma situação em que ela pode ajudar, pois ela tem o conhecimento, informação ou recurso e automaticamente ela age nesse sentido. Mas frequentemente isso não dá tão certo, pois o outro não reconhece, não agradece ou se incomoda. E pode ser até que reclame da “ajuda”, da intromissão. Se você reconhece essa situação de tentar ajudar e se frustrar, imagino que esteja entrando no papel de Salvador, sem nem perceber.
PERSEGUIDOR
É aquela pessoa que costuma ser criterioso, perfeccionista ou detalhista, que gosta das coisas de uma certa maneira, que se incomoda com o estilo “mais ou menos”, que se incomoda com certas atitudes das outras pessoas. E frequentemente faz um comentário, uma sugestão, uma crítica, mesmo que com a intenção de ajudar ou ensinar ou melhorar algo/alguém. E os outros não gostam, se irritam, se aborrecem, se vitimizam. Para completar, muitas vezes surge uma terceira pessoa para defender a Vítima. Ai pronto, a confusão está armada.
VÍTIMA
Para essa pessoa é difícil lidar com pressão, de tempo, de prazos, estresse, cobranças ou críticas. Também pode ser difícil assumir uma responsabilidade, uma decisão. Muitas vezes a sensação é que deu um branco, a informação sumiu. Precisa de ajuda para continuar, para pensar, para decidir. Nesse ponto surge o Salvador ou o Perseguidor, depende do jogo que se joga. E depois que o jogo começa, com certeza surgem o mal-entendido, o ressentimento, a mágoa.
Nos jogos sempre temos pelo menos duas pessoas ocupando inicialmente dois papéis diferentes e conforme o jogo roda há uma mudança de papéis e é isso que leva ao mal-estar.
Há vários tipos de jogos, mas com certeza aprender a identificar e evitar as iscas e entrar nos papéis, nos ajuda a ter consciência do tipo de comunicação que estamos propondo. Se nos mantemos no circuito positivo dos estados de ego, se conseguimos voltar para o ego Adulto, conseguimos manter uma comunicação eficaz e saudável.
Maila Flesch,
Psicóloga, Analista Transacional, coach, SP.
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Em momentos de estresse , tensão ou mal-estar em nosso dia a dia, recorremos ao que chamamos de comportamentos compulsores, numa tentativa inconsciente de recuperarmos um sentido de segurança interna, de saber o que fazer para então nos sentirmos melhor. Veja abaixo os diferentes estilos e saiba que cada um de nós usa um ou dois desses comportamentos na busca dessa segurança.
O apressado é impaciente, agitado, acha que o tempo nunca é suficiente, geralmente interrompe ou completa a fala do outro, é tenso, fala e pensa rápido.
O agradável é solícito, está sempre pronto a ajudar, sente-se responsável pelos outros e tem dificuldade em dizer "Não".
O esforçado acha que as coisas são difíceis, complicadas, sente que só consegue as coisas com muito esforço. Costuma ser ansioso e ter dificuldade para relaxar.
O perfeccionista é detalhista, exigente, crítico, muitas vezes parece ser controlado, sério e atento.
O forte não demonstra e não se envolve com suas emoções, sente-se responsável em resolver os problemas de todos, puxa para si muitas tarefas e se diverte pouco.
Estes compulsores geram um novo mal estar, pois não é possível cumprí-los na íntegra e não conseguimos relaxar, nos divertir, aproveitar o momento. Eis o retorno de um medo da infância, o de só ser amado (agradar) se fizermos isto ou aquilo. Precisamos primeiro acalmar este medo, não precisamos provar nada, podemos ser amados e podemos aceitar nossas limitações. Assim, propomos que cada um identifique abaixo o que necessita repetir para si mesmo para se permitir uma vida menos tensa e mais prazerosa.
Para o apressado: Faça as coisas tranqüilamente. Fale devagar, todos vão escutar. Tome o tempo necessário, organize-o e faça bem feito o que é possível. Viva e desfrute o presente.
Para o agradável: Não é sua responsabilidade fazer os outros se sentirem bem e não conseguirá agradar a todos. Você pode fazer o que gosta. Se alguém precisar de algo poderá pedir. Você pode pensar diferente dos outros e dizer "Não".
Para o esforçado: Não complique, escolha metas possíveis e cumpra-as de modo eficaz. Seja direto e objetivo. A vida também pode ser boa e divertida, não é só uma luta. Não faça o trabalho dos outros, faça a sua parte. Aprenda a fazer coisas de maneira simples e fácil.
Para o perfeccionista: É suficiente fazer as coisas bem feitas, não há necessidade de perfeição. Seja objetivo e veja o que é realmente necessário. Só corrija quando pedirem. Aceite as pessoas como elas são. Aceite-se como você é.
Para o forte: Você pode sentir e mostrar o que sente, isto não é ser fraco. Você pode pedir ajuda. Os outros também têm capacidades e não são tão frágeis como você imagina.
Maila Flesch, Analista Transacional, psicóloga, supervisora e instrutora de Análise Transacional, SP.
Algumas vezes parece que não conseguimos conversar objetivamente. Temos a sensação de que conversamos com o outro mas que não deu certo. Fica a sensação de que não recebemos uma resposta, não conseguimos combinar alguma coisa ou não entendemos o que aconteceu, enfim...
Isso é muito frequente e está relacionado a um mecanismo inconsciente, chamado redefinição, por meio do qual a pessoa tenta evitar a responsabilidade de assumir uma posição que seria desagradável para ela.
Cada pessoa tem um quadro de referência próprio, ou seja, um conjunto de crenças sobre si, sobre os outros e sobre a vida, assume alguns papéis e valores que a definem. Quando uma pergunta ou uma conversa ameaça ou confronta essas crenças, papéis ou valores, fazemos uma tentativa para evitá-la. Fazemos isto redefinindo a questão, ou seja, não damos a resposta diretamente, mudamos um pouco o foco da questão e pronto, geralmente o outro não percebe esta manobra e a ameaça passou. Pelo menos por algum tempo, até que o outro traga o assunto de volta. Isto pode se tornar recorrente ou gerar uma discussão mais séria. Por exemplo, a esposa diz ao marido que precisam planejar o carnaval e pergunta onde ele gostaria de ir. Ele responde que ainda está pagando as despesas do ano novo. Ela fica confusa e pensa se isto quer dizer que não vão viajar? Ele não quer dizer isso e talvez não assuma esta posição, pois assumiu um papel de provedor, que gosta de oferecer coisas boas para a família e se vê como um bom marido e pai . Sua preocupação financeira é real, mas é bem possível que não consiga falar disso com a família e o que vai acontecer depende de como esta conversa vai continuar.
Como evitar essa situação? Aquele que não recebeu a resposta desejada pode colocar a sua pergunta novamente e se fizer isto sem crítica ou confrontação terá um resultado melhor. É importante lembrar que o outro está se defendendo, porque assumiu que responder é desconfortável ou ameaça sua imagem, sua posição.
Se mantivermos o exemplo, a esposa poderia perguntar novamente levando em consideração a informação que ele já deu com sua resposta. Para a esposa também é um desafio e se dessa vez os planos dela forem frustrados? Ele consegue falar dos seus problemas e ela consegue fazer planos que fiquem dentro do orçamento?
Esta situação se repete constantemente no ambiente familiar e no ambiente profissional. Por apenas dois dias preste atenção às respostas que você recebe e veja se são diretas ou indiretas. Talvez você encontre uma maneira de começar uma comunicação mais eficaz a partir disto.
Boa sorte.
Maila Flesch, Analista Transacional, psicóloga, supervisora de Análise Transacional, SP.
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Uma pessoa com boa auto-estima e que se ama é autêntica, espontânea, gosta de se divertir e de brincar, expõe suas emoções. Isso a torna interessante e atrai as pessoas, amigos e amigas. Uma destas pessoas pode ser um amor.
1) Qual é o caminho de desenvolvimento da auto-estima?
A auto-estima é o valor que atribuímos a nós mesmos, a imagem que temos de nós mesmos, mas esta imagem é construída a partir da relação com o outro.
A base da auto-estima é desenvolvida na infância, quando a criança forma uma imagem de si mesma e dos outros baseada na relação com seus familiares. Se a criança percebe que o que ela diz e o que ela faz recebe a atenção positiva dos outros, é respeitada, elogiada e admirada ela forma uma imagem positiva de si mesma.
Se o que a criança diz e faz for constantemente criticado, corrigido, ignorado ou se a criança for ignorada e criticada, ela forma uma imagem negativa de si mesma.
Pais perfeccionistas exigem demais da criança e não dão a oportunidade dela aprender aos poucos, do seu próprio jeito e no seu ritmo. A criança não passa por descobertas, conquistas, ensaio e erro. Ela é constantemente ensinada ou corrigida. Isto gera grande insegurança.
Pais super-protetores fazem muitas coisas pela criança, que ela mesma já poderia fazer ou tentar fazer e com isto ela também não tem a oportunidade de aprender aos poucos, do seu próprio jeito e no seu ritmo. Ela não passa por descobertas, conquistas, ensaio e erro. Ela sente-se incapaz ou incompetente e assume a crença "Eu não consigo...."; "Eu não sei..".
Na adolescência a necessidade de aprovação é comum, a opinião dos colegas é muito importante e há uma constante busca de aprovação do grupo. Isto é ainda mais fortes nos adolescentes com baixa autoestima.
Na fase adulta a pessoa já construiu a sua auto-imagem a sua auto-estima, mas a auto-estima pode variar conforme situações específicas. Em situações de isolamento, de crítica constante, de rejeição ou humilhação a auto-estima é prejudicada.
2) É comum a gente dissimular a falta de auto-estima? Ou seja, quais são os mecanismos pelos quais tentamos fugir do problema?
Pessoas que têm a auto-estima baixa, sentem-se inseguras ou inadequadas podem reagir de diferentes maneiras:
- algumas se retraem por se sentirem inadequadas e ficam sempre à margem, na sombra de outras pessoas. Não acreditam que podem conseguir, conquistar, alcançar o que desejam, às vezes não ousam desejar
- algumas se submetem e deixam que os outros dirijam a sua vida
- algumas se dedicam a cuidar dos outros assim não precisam entrar em contato com suas próprias necessidades e emoções.
- algumas disfarçam essa insegurança e projetam a inadequação no outro. Ou seja, a pessoa é OK mas o outro é que não é confiável, capaz, etc.
3) A falta de auto-estima é prejudicial: mas como ela pode minar nossos relacionamentos amorosos ou até impedir que eles aconteçam?
A falta de autoestima pode minar o relacionamento amoroso saudável. Num relacionamento amoroso as pessoas buscam um parceiro para amar e se relacionar, isto implica em duas vias, amar o outro e ser amado, conquistar e ser conquistado, seduzir e ser seduzido, dar e receber, cuidar e ser cuidado.
Com a auto-estima baixa a pessoa não consegue estar numa relação de igual para igual, a pessoa insegura freqüentemente busca a aprovação do outro e se preocupa em agradar. Aos poucos vai perdendo sua identidade, sua característica pessoal, abre mão de um jeito próprio de agir para agir de acordo com o que ela pensa que o outro deseja. Muitas vezes isto faz com que deixe de ser interessante para o parceiro, porque deixa de ser diferente para se tornar muito igual. A troca acaba, o parceiro sente que não precisa mais conquistar, cuidar. O relacionamento esfria.
4) Quais são os mecanismos mais comuns e também os sentimentos presentes nesse processo (ciúmes/ medo da perda/ desconfiança eterna/ culpa????).
a) insegurança, tentativa de agradar ao parceiro, faz o que imagina que o outro gosta/deseja, perde a sua identidade, abre mão de gostos pessoais e depois culpa o outro (em alguns casos cobra que o outro também se sacrifique).
b) ou então a insegurança gera o medo de perder, desconfiança, ciúmes. Assim crescem as acusações, as brigas verbais e as vezes as agressões físicas. Este circuito negativo alimenta a sensação de inadequação e a baixa auto-estima. O parceiro começa a omitir informações aí o outro comprova algumas mentiras e o cenário fica completo. Até que algo rompa este circuito.
5) Em linhas gerais, qual é a origem da falta de auto-estima?
A auto-estima é desenvolvida quando a criança se sente importante e amada, sem ser cobrada, é encorajada e elogiada por aquilo que faz do seu próprio jeito, por ser quem é.
A origem da falta de auto-estima está em a criança se sentir inadequada ou seja estão solicitando mais do que ela pode dar (naquela idade), não se sentir importante, não se sentir amada, ou só sentir-se amada se (...) se comportar direito, fizer o que mamãe pediu, etc.
Também é muito comum que os pais tentem ensinar ou corrigir os filhos quando eles ainda não sabem fazer aquilo devido à sua idade, e a criança fica com a sensação de que não consegue fazer nada direito, não consegue agradar, não consegue de causar impacto.
Dificuldade de confiar, de se aproximar das pessoas, de sentir que faz parte do grupo, de sentir e agir livremente sem se preocupar se está agradando.
6) O que é possível fazer quando o problema já está instalado? Quais as atitudes, dicas e ações práticas que a pessoa pode fazer para virar o jogo e conseguir levantar a auto-estima?
Recuperar ou desenvolver a auto-estima está relacionado com a aceitação e valorização de si. Para isto ajuda conseguir compreender a situação familiar, as características pessoais e as dificuldades emocionais dos adultos que foram importantes na infância da pessoa. E como isto influenciou a formação da personalidade da criança. Muitas inseguranças são mensagens incorporadas ou conclusões que a criança tirou a partir destes relacionamentos.
Atualmente a pessoa tem outras pessoas a seu redor que podem dar apoio para que ela se expresse.
Se permitir começar de novo, experimentar sem julgar, descobrir do que gosta. Se dar os parabéns toda vez que descobrir algo novo, toda vez que agir de maneira nova. Proteger sua criança interna de críticas e julgamentos.Exigir respeito por seus sentimentos. Olhar ao redor e perceber pessoas que julgam ou criticam pouco e são criativas e divertidas. Aproximar-se destas pessoas e aprender com elas que é mais divertido experimentar e errar do que só fazer aquilo que os outros aprovam. Perceber que agora que é adulta não há grandes "castigos" a temer.
7) Dá para fazer isso sem um tratamento terapêutico?
Tentativa de resolver a questão sem um terapeuta:
Imagine que você carrega dentro de si uma pequena criança assustada, com medo de fazer a coisa errada. E assumir uma atitude protetora em relação a esta criança, ajudando-a a ver as coisas boas que ela tem. Ame essa criança, explore o que a faz feliz e permita isso para você. Dê a esta criança o amor e aceitação que ela não recebeu antes. Faça isso durante vários dias ou semanas até que você perceba uma mudança, até que você comece a se permitir o que você quer ou gosta sem sentir medo ou culpa.
Pode parecer difícil mas provavelmente você conseguiria fazer isto para uma outra pessoa, então experimente fazer por você.
8) Quando o tratamento terapêutico é indicado e de que forma pode ajudar?
A terapia é indicada se a crítica interna não ceder e a pessoa não conseguir se dar a permissão para experimentar ser e fazer de um jeito novo que a faça mais feliz.
O objetivo da terapia é recuperar a confiança básica de ser merecedor de amor e atenção, desfazer a sensação de inadequação, diminuir a auto-crítica e recontactar a espontaneidade, a aceitação e a alegria da criança interna.
Maila Flesch
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Trago aqui um artigo interessante de Richard Erskine "Diversidade, Unidade e Relacionamento: Dinâmicas Interpessoais da Psicologia Social", que fez muito sentido para mim. É fácil relacionar seu artigo às questões mundiais e nacionais, onde percebo intolerância e falta de respeito pelo ser humano, pela vida e inclusive pelo meio ambiente. Mas percebi que o artigo trazia algo mais rico e relacionado ao meu dia a dia e resolvi revê-lo na perspectiva pessoal e nos diferentes papéis. Abaixo apresento alguns trechos desse artigo e convido a fazerem essa reflexão. Quão freqüentemente rotulamos as pessoas sem conhecê-las de verdade? Será que nos lembramos disso suficientemente e nos mantemos abertos para conhecer o outro? Aprender a lidar com a diversidade, criando um espaço em nós e ao nosso redor que abarque diferentes estilos e pensamentos é realmente um desafio interessante e necessário para continuarmos atualizados e em crescimento.
...."Eu estou OK, você está OK" é uma premissa básica da Análise Transacional. Mas como eu posso estar OK com você se você é tão diferente de mim? E se falamos diferente? E se meu comportamento for imprevisível? E se eu tiver valores diferentes? Ainda assim posso estar OK com você? E você ainda pode estar OK comigo apesar dessa diversidade?
Grande parte do conflito político neste mundo indica que as pessoas têm grande dificuldade com a diversidade. A diversidade é perturbadora. Pessoas que são diferentes podem parecer inconsistentes, não confiáveis. O modo estranho dessa pessoa pode ser interpretado por nós como preguiçoso, louco, tolo, mau ou errado. Essas percepções distorcidas ocorrem devido a percepções incompletas. Na realidade não conhecemos a experiência daquela outra pessoa então completamos a Gestalt com alguns aspectos de nossa experiência passada; nós completamos como entendemos a outra pessoa com nosso próprio medo; nós interpretamos seu comportamento com nossa própria projeção inconsciente. E assim criamos uma imagem das diferenças das outras pessoas. De acordo com Martin Buber, às vezes criamos a outra pessoa como uma "coisa" ao invés de ver o sagrado inerente ao seu ser. A essas percepções incompletas e mal-formadas sempre falta empatia. Nós falhamos ao não considerar o comportamento da outra pessoa dentro do domínio de sua sensibilidade e necessidades relacionais únicas e assim ficamos alienados inter- e intrapessoalmente.
Procuramos unidade devido à fome do ser humano por relacionamento. Como nos tornamos unidos nos relacionamentos se somos tão únicos, diferentes e diversificados? A integração de uma perspectiva relacional dos conceitos de psicoterapia e psicologia social podem oferecer respostas desafiantes a essas questões.
Unidade requer interesse genuíno na outra pessoa, um interesse que nos leva a um questionamento; o questionamento da sua experiência fenomenológica; ou seja, a maneira subjetiva que cada um de nós processa transações interpessoais e atribui diferentes significados à mesma experiência. Nós emergimos de um mesmo evento, com valores diferentes. Um questionamento genuíno, para ser efetivo na busca de conhecer o outro, sempre começa com a premissa "Eu não sei nada sobre a experiência do outro: minhas percepções, minha interpretação, meus significados são incompletos."
Portanto, preciso conhecê-lo por meio do questionamento: quem é você, o que você valoriza, como você entende o que está acontecendo, o que você sente. Se eu não perguntar, eu não sei nada além da minha interpretação de você. Permaneceremos separados. Um de nós precisa cruzar a ponte desta separação. O questionamento é parte do processo. Mas é difícil lidar com a incerteza, a ansiedade de nos conhecermos, atravessando a barreira de nossas próprias interpretações, histórias e medos. Se realmente questionamos e procuramos conhecer o outro de maneira profunda, se aprendemos suas perspectivas, sua singularidade e suas diferenças, então sua diversidade irá desafiar e talvez provocar mudanças em nós. Isso pode gerar ansiedade. Um interesse genuíno na diversidade requer uma disposição para tolerar ansiedade, ser perturbado, ser impactado pelo outro, ser tocado emocionalmente e talvez ser mudado. Quando estamos abertos para a diversidade e valorizando a singularidade do outro, mesmo as transações breves podem ter efeito e gerar crescimento.
Unidade e relacionamento requerem a atitude de honrar a singularidade e diversidade da outra pessoa. Precisamos trabalhar para conhecê-los e isso leva tempo. Requer a suspensão do julgamento. Metaforicamente é como entrar na pele do outro para experienciar seu mundo, como o ouve e o vê. A tarefa psicológica de se conectar ao outro inclui conhecer e valorizar a perspectiva do outro e ao mesmo tempo não se desligar da sua própria singularidade, mantendo a sua própria perspectiva enquanto permite que esta seja mudada. Ao nos abrirmos para conhecer o outro criamos uma nova síntese de nosso self através do relacionamento.
DIVERSITY, UNITY AND RELATIONSHIP: INTERPERSONAL DYNAMICS OF SOCIAL PSYCHOLOGY - Este artigo foi publicado originalmente no ITA News, Nº 54, 1999, pp. 17-18. Richard G Erskine, Ph.D. - Institute for Integrative Psychotherapy, New York, NY
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